Em algum momento da vida, você com certeza já experienciou o orgulho. Podemos sentir orgulho quando recebemos um elogio em uma reunião de trabalho, por exemplo. Podemos sentir orgulho de outra pessoa, como pais costumam sentir orgulho das conquistas dos filhos.
Apesar de ser uma emoção intrinsecamente associada ao eu, o orgulho depende de situações e figuras externas. Isso porque, o orgulho está ligado ao reconhecimento social, o olhar do outro é essencial para a consolidar a nossa percepção de quem somos1,2.
O orgulho cumpriu papel fundamental na evolução, porque estimulava a contribuição para o grupo, elevando o status social, e fomentando vínculos3.
Mas, o orgulho é também uma emoção contraditória. Se por um lado ele ajuda na construção da auto afirmação, da autoestima e do senso de identidade, por outro, pode gerar arrogância, sensação de superioridade e atrapalhar a nossa capacidade de reconhecer vulnerabilidades4,5.
O “orgulho ferido”: uma dor real
Você já passou por uma situação onde foi criticado negativamente, ou se sentiu rejeitado, algo que foi além de uma frustração social? Algo que doeu dentro de você, e causou a sensação que comumente descrevemos como “orgulho ferido”, e representa uma ameaça ao autovalor.
Segundo Freud, essa “ferida narcisista” causa um rompimento da ligação do eu com a sua autoimagem idealizada6. O orgulho ferido toca uma parte fundamental da construção do eu, que está relacionada ao desejo de ser amado, aceito e reconhecido. Nesse sentido, o orgulho se torna um mecanismo de defesa contra a dor social, para proteger a identidade7.
Além disso, pesquisas em neurociência explicam que essa dor social ativa as mesmas áreas de uma dor física, o córtex cingulado anterior e a ínsula anterior8. O cérebro então interpreta essa dor como uma ameaça verdadeira à sobrevivência emocional9 e responde ativando o mecanismo de defesa.
Nesse momento podemos usar a negação, a raiva ou até a racionalização, que podem soar como orgulho, mas na verdade são o cérebro tentando evitar uma dor profunda. E é por isso que temos dificuldade em lidar com o “orgulho ferido”, porque ele afeta o equilíbrio entre a aceitação emocional e a autodefesa.
Ponto de transformação
Mas, então, como podemos lidar com o orgulho? É aí que mora o desafio do amadurecimento, pois precisamos reconhecer nossas imperfeições e vulnerabilidades, de maneira que não gerem a sensação de que estamos ferindo nosso valor pessoal2.
A meta é, mesmo diante de uma falha que possa gerar críticas e rejeição, sermos capazes de sustentar nossa dignidade. Isso é possível através da neuroplasticidade, que explica que somos capazes de construir novos caminhos neurais. Através da autorreflexão, da meditação e até da terapia psicológica, é possível criar ou expandir os caminhos neurais para que sejamos mais tolerantes com as frustrações e menos reativos. E com isso, usarmos menos o orgulho como mecanismo de defesa10.
Conclusão
O orgulho tem seus prós e contras, enquanto ele ajuda a construir a reafirmar a autoestima e a identidade, ele também revela nossas vulnerabilidades mais profundas. E quando não somos vistos, reconhecidos ou aceitos, precisamos usar a dor do “orgulho ferido” como ponte para a autoaceitação e não para a reação.
Aprender a lidar com o orgulho começa com aceitar que todos nós temos a necessidade de sermos aceitos e amados, e a virada de chave está em manter o equilíbrio entre o amor-próprio e a humildade, entre a força e a vulnerabilidade.
1- KOHUT, Heinz. The Analysis of the Self. New York: International Universities Press, 1971.
2 – WINNICOTT, Donald W. The Maturational Processes and the Facilitating Environment. London: Hogarth Press, 1965.
3 – KELTNER, Dacher. Born to Be Good: The Science of a Meaningful Life. New York: W. W. Norton, 2009.
4 – BROWN, Brené. Daring Greatly: How the Courage to Be Vulnerable Transforms the Way We Live, Love, Parent, and Lead. New York: Gotham Books, 2012.
5 – RIZZI, Rita. O que é: Psicologia do Orgulho. Psicóloga Rita Rizzi, 2023. Disponível em https://www.psicologaritarizzi.com.br/glossario/o-que-e-psicologia-do-orgulho/. Acesso em: 07 nov 2025.
6 – FREUD, Sigmund. Introdução ao narcisismo (1914). In: FREUD, S. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996. v. XIV.
7 – LACAN, Jacques. O estádio do espelho como formador da função do eu. In: LACAN, J. Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
8 – EISENBERGER, Naomi I.; LIEBERMAN, Matthew D. Why it hurts to be left out: The neurocognitive overlap between physical and social pain. Trends in Cognitive Sciences, v. 8, n. 7, p. 294–300, 2004.
9 – EISENBERGER, Naomi I. The pain of social disconnection: examining the shared neural underpinnings of physical and social pain. Nature Reviews Neuroscience, v. 13, n. 6, p. 421–434, 2012.
10 – SIEGEL, D. J. The Developing Mind: How Relationships and the Brain Interact to Shape Who We Are. New York: Guilford Press, 2012.
